quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Não estás deprimido, estás distraído


Diante da desilusão que me pegou nesta semana, o amigo Zé Mauricio Cagno envia um texto de Facundo Cabral. No mínimo, tocante.
Facundo Cabral é um cantor Argentino (a cara do Magno Bucci), nascido em 22 de maio de 1937 na cidade de Balcarce, província de Buenos Aires, Argentina. Em tenra idade seu pai deixou a casa deixando a mãe com três filhos, que emigraram para Tierra del Fuego no sul da Argentina.
Cabral teve uma infância dura e desprotegida, tornando-se um marginal, a ponto de ser internado em um reformatório. Em pouco tempo conseguiu escapar e, segundo conta, encontrou Deus nas palavras de Simeão, um velho vagabundo
Em 1970, ele gravou "No Soy De Aquí, Ni Soy De Allá" e seu nome fica conhecido em todo o mundo, gravando em nove idiomas e com cantores da estatura de Julio Iglesias, Pedro Vargas e Neil Diamond, entre outros.
Influenciado, no lado espiritual, por Jesus, Gandhi e Madre Teresa de Calcutá, na literatura por Borges e Walt Whitman, sua vida toma um rumo espiritual de observação constante em tudo o que acontece em seu redor, não se conformando o que vê, durante sua carreira como um cantor de Música Popular e, toma o caminho da crítica social, sem abandonar o seu habitual senso de humor.
Como um autor literário, foi convidado para a Feira Internacional do Livro, em Miami, onde conversou sobre seus livros, entre eles: “Conversaciones con Facundo Cabral”, “Mi Abuela y yo”, “Salmos”, “Borges y yo”, “Ayer soñé que podía y hoy puedo”, y el “Cuaderno de Facundo”.
Em reconhecimento do seu constante apelo à paz e amor, em 1996, a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) o declarou "Mensageiro mundial da Paz”.
Vamos ao texto:


Não estás deprimido, estás distraído

Não estás deprimido, estás distraído.
Distraído em relação à vida que te preenche, distraído em relação à vida que te rodeia, golfinhos, bosques, mares, montanhas, rios.
Não caias como caiu teu irmão que sofre por um único ser humano, quando existem cinco mil e seiscentos milhões no mundo. Além de tudo, não é assim tão ruim viver só. Eu fico bem, decidindo a cada instante o que desejo fazer, e graças à solidão conheço-me. O que é fundamental para viver.
Não faças o que fez teu pai, que se sente velho porque tem setenta anos, e esquece que Moisés comandou o Êxodo aos oitenta e Rubinstein interpretava Chopin com uma maestria sem igual aos noventa, para citar apenas dois casos conhecidos.

Não estás deprimido, estás distraído.
Por isso acreditas que perdeste algo, o que é impossível, porque tudo te foi dado. Não fizeste um só cabelo de tua cabeça, portanto não és dono de coisa alguma. Além disso, a vida não te tira coisas: te liberta de coisas, alivia-te para que possas voar mais alto, para que alcances a plenitude.
Do útero ao túmulo, vivemos numa escola; por isso, o que chamas de problemas são apenas lições. Não perdeste coisa alguma: aquele que morre apenas está adiantado em relação a nós, porque todos vamos na mesma direção.
E não esqueças, que o melhor dele, o amor, continua vivo em teu coração.
Não existe a morte, apenas a mudança.
E do outro lado te esperam pessoas maravilhosas: Gandhi, o Arcanjo Miguel, Whitman, São Agostinho, Madre Teresa, teu avô e minha mãe, que acreditava que a pobreza está mais próxima do amor, porque o dinheiro nos distrai com coisas demais, e nos machuca, porque nos torna desconfiados.
Faz apenas o que amas e serás feliz. Aquele que faz o que ama, está benditamente condenado ao sucesso, que chegará quando for a hora, porque o que deve ser será, e chegará de forma natural.
Não faças coisa alguma por obrigação ou por compromisso, apenas por amor.
Então terás plenitude, e nessa plenitude tudo é possível sem esforço, porque és movido pela força natural da vida. A mesma que me ergueu quando caiu o avião que levava minha mulher e minha filha;
a mesma que me manteve vivo quando os médicos me deram três ou quatro meses de vida.
Deus te tornou responsável por um ser humano, que és tu. Deves trazer felicidade e liberdade para ti mesmo.
E só então poderás compartilhar a vida verdadeira com todos os outros.
Lembra-te: "Amarás ao próximo como a ti mesmo".
Reconcilia-te contigo, coloca-te frente ao espelho e pensa que esta criatura que vês, é uma obra de Deus, e decide neste exato momento ser feliz, porque a felicidade é uma aquisição.
Aliás, a felicidade não é um direito, mas um dever; porque se não fores feliz, estarás levando amargura para todos os teus vizinhos.
Um único homem que não possuiu talento ou valor para viver, mandou matar seis milhões de judeus, seus irmãos.
Existem tantas coisas para experimentar, e a nossa passagem pela terra é tão curta, que sofrer é uma perda de tempo.
Podemos experimentar a neve no inverno e as flores na primavera, o chocolate de Perusa, a baguette francesa, os tacos mexicanos, o vinho chileno, os mares e os rios, o futebol dos brasileiros, As Mil e Uma Noites, a Divina Comédia, Quixote, Pedro Páramo, os boleros de Manzanero e as poesias de Whitman; a música de Mahler, Mozart, Chopin, Beethoven; as pinturas de Caravaggio, Rembrandt, Velázquez, Picasso e Tamayo, entre tantas maravilhas.
E se estás com câncer ou AIDS, podem acontecer duas coisas, e ambas são positivas:
se a doença ganha, te liberta do corpo que é cheio de processos (tenho fome, tenho frio, tenho sono, tenho vontades, tenho razão, tenho dúvidas)
Se tu vences, serás mais humilde, mais agradecido... portanto, facilmente feliz, livre do enorme peso da culpa, da responsabilidade e da vaidade,
disposto a viver cada instante profundamente, como deve ser.

Não estás deprimido, estás desocupado.
Ajuda a criança que precisa de ti, essa criança que será sócia do teu filho. Ajuda os velhos e os jovens te ajudarão quando for tua vez.
Aliás, o serviço prestado é uma forma segura de ser feliz, como é gostar da natureza e cuidar dela para aqueles que virão.
Dá sem medida, e receberás sem medida.
Ama até que te tornes o ser amado; mais ainda converte-te no próprio Amor.
E não te deixes enganar por alguns homicidas e suicidas.
O bem é maioria, mas não se percebe porque é silencioso.
Uma bomba faz mais barulho que uma caricia, porém, para cada bomba que destrói há milhões de carícias que alimentam a vida.
Facundo Cabral

sábado, 1 de agosto de 2009

Verbas da Eletrobrás foram para contas de empresas dos Sarney



Autor(es): Bernardo Mello Franco
O Globo - 30/07/2009

Documentos inéditos em análise no Ministério da Cultura (MinC) apontam novas irregularidades e indícios de fraude em contas do Instituto Mirante, ONG presidida por Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), e alvo de investigações da Polícia Federal.

A entidade informou ter recebido R$ 220 mil da Eletrobrás para financiar projetos culturais no Maranhão, com base na Lei Rouanet. No entanto, auditores do MinC descobriram que parte dos gastos declarados não confere com os extratos bancários do instituto. Além disso, pelo menos R$ 116 mil — o equivalente a 52% do dinheiro captado — foram parar em contas de empresas ligadas à família Sarney.

O processo do Instituto Mirante se arrasta desde 2005, quando a ONG foi autorizada a captar R$ 4,32 milhões em dinheiro de renúncia fiscal.

Desde então, a entidade informou ter recebido R$ 220 mil da Eletrobrás — valor que tentou alterar posteriormente, sem convencer os auditores. Por causa dos problemas, a ONG chegou a ser declarada inadimplente seis vezes, como registra o sistema de acompanhamento dos processos do MinC.

Cansada de cobrar explicações, a coordenadora-geral de Avaliação e Prestação de Contas do MinC, Maria da Glória Rocha, ameaçou pedir ao Tribunal de Contas da União (TCU) a abertura de uma tomada de contas especial. O ultimato foi dado em 24 de março deste ano, em ofício enviado a Fernando Sarney. Depois disso, o Instituto Mirante apresentou novas justificativas, ainda não analisadas.

Listadas diversas irregularidades

As principais irregularidades estão listadas no “Relatório de análise financeira da prestação de contas final”, emitido em outubro de 2008 e enviado aos dirigentes da ONG. Segundo o documento, os valores apresentados pelo Instituto Mirante não conferem com os extratos bancários, e não foram apresentadas provas da movimentação bancária. Além disso, houve pagamentos indevidos a título de elaboração e agenciamento de projetos, entre outros problemas.

Segundo os papéis do instituto, o dinheiro foi captado junto à Eletrobrás, entre maio e dezembro de 2006. No período, a estatal era subordinada ao então ministro de Minas e Energia Silas Rondeau, que foi indicado por Sarney e está sob investigação da Polícia Federal.

Em maio, Fernando Sarney informou ter recebido R$ 70 mil para organizar o “Baile do Fofão”, apresentado ao MinC como uma festa de carnaval.

Posteriormente, ele alegou que o evento teria sido financiado com recursos próprios, mas os extratos bancários comprovam o depósito da Eletrobrás. Em dezembro, Fernando disse ter captado mais R$ 150 mil para o “Brilha São Luís”, que previa a organização de corais natalinos, a iluminação da Torre de São Francisco e a decoração natalina da cidade. Segundo admitiu o próprio Mirante, só o primeiro item saiu do papel.

Ao conferir as notas fiscais do processo, O GLOBO constatou que o instituto usou empresas ligadas à família Sarney para justificar o uso de mais da metade dos recursos. Só a TV Mirante emitiu recibos no valor de R$ 67 mil, a título de venda de publicidade para os dois projetos. A Rádio Mirante teria recebido R$ 7,2 mil, e a Gráfica Escolar, R$ 6 mil. A lista de notas inclui até a Associação dos Amigos do Bom Menino das Mercês (Abom), uma das ONGs da família suspeitas de desviar recursos públicos. A Abom emitiu duas notas no valor total de R$ 9 mil.

O processo também revela a existência de mais uma suposta empresa fantasma ligada à família Sarney: o Centro Brasileiro de Produção Cultural (CBPC), que emitiu notas fiscais no valor de R$ 27 mil para o Instituto Mirante. O endereço declarado pelo CBPC à Receita Federal é o mesmo em que funcionam, em São Luís, a TV Mirante, o jornal “O Estado do Maranhão” e o próprio instituto que captou o dinheiro. Nas notas fiscais, aparece outro endereço suspeito, visitado ontem pelo GLOBO. Lá funciona, desde 2006, o Conselho Regional de Medicina Veterinária do Maranhão.

Outro indício de fraude é um recibo assinado por Fábio Henrique Gomes Aguiar, que se apresenta como responsável pelo CBPC. Fernando Sarney enviou um ofício ao MinC nomeando Fábio como representante do Instituto Mirante junto ao ministério. Fábio é apresentado como roteirista do filme “O Dono do Mar”, baseado num livro de Sarney. Ele não foi encontrado ontem nos endereços e telefones informados ao MinC. A cópia de um dos cheques enviados ao ministério, no valor de R$ 7 mil, traz no canhoto a seguinte inscrição: “Fabão comissão”.

Ontem, Diogo Adriano, ex-secretárioexecutivo do Instituto Mirante, disse que o CBPC nunca funcionou no endereço declarado à Receita. Inicialmente, ele afirmou não conhecer a empresa. Quando soube que os recibos eram assinados por Fábio, confirmou o vínculo, mas não soube explicar os serviços prestados pelo suposto assessor de Fernando.

— Se eu não me engano, ele colaborou em alguns projetos, mas não sei dizer quais. Mas, com certeza, a empresa dele nunca funcionou no endereço do Mirante — disse.

Sobre o fato de a maior parte do dinheiro ter parado em contas de empresas da família, foi lacônico: — São os veículos líderes daqui.

A questão ética eu apresentei ao ministério, mas eles disseram que não havia problema algum.

O advogado Eduardo Ferrão, que defende Fernando Sarney, disse não conhecer os documentos do MinC.